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quinta-feira, 16 de outubro de 2014

LAMPIÃO - Não era nem frouxo e nem adamado (Resposta ao livro 'Mata Sete')





Quem poderia chamar Lampião de cabra frouxo, adamado, besta idiota e outros adjetivos? Pode-se chama-lo de bandido, desalmado, perverso, e outras coisas. Mas de frouxo não tinha nada, e muito menos afeminado!

O seu maior inimigo, o Tenente José Lucena, chegou até mesmo a mostrar seu reconhecimento da bravura desse cabra da peste. O caso se deu na primeira batalha entre os dois, onde o Tenente José Lucena e Lampião ficaram temendo-se mutuamente.
De sua parte José Lucena temendo  e receando a sagacidade de Lampião e o temível cangaceiro, respeitando a força do Tenente pelo poderio.
Frederico Bezerra Maciel em sua sextologia ‘Lampião, Seu Tempo e Reinado’ no segundo livro ‘A Guerra de Guerrilhas’ citado e apresentado artigo por mim escrito com o tema Lampiao, o guerreiro que corria atras do vento onde transcrevo Ipsis litteris um dos capítulos do livro para que os leitores sintam o grande estrategista que foi Lampião, onde encontramos esse testemunho do há época,Tenente José Lucena seu maior inimigo.
 

Tive a curiosidade de ler o livro 'Lampião o mata sete', e encontrei-o muito repetitivo para quem quer escrever algo sobre Lampião. Não procurei puxar pela memória e nem pela real história, para saber que as palavras contidas no livro, estão eivadas de impropérios particulares do autor contra o famigerado bandido. Não estou chamando o autor de mentiroso e longe de mim fazer isso com um juiz aposentado, que deve ter julgado muitos casos no sertão sergipano, contra bandidos. E de certo o magistrado deve ter julgado com honra e respeito até mesmo os piores bandidos que passaram em sua vara criminal, como homem civilizado que é.
Talvez o autor do livro tenha enveredado pelo ouvir dizer de pessoas comuns ou por aqueles que odiavam e ainda odeiam o cangaceiro Virgulino Ferreira. Como sabemos o ódio pode ser usado contra os inimigos em sua pior forma, o falso testemunho.
Quanto ao cerne da questão, se Lampião possuía essa característica de 'homem afeminado' não encontrei realmente nenhuma base histórica para a acusação que assim se portava e nenhum indicativo de escritores e pesquisadores do cangaço, indicados por ele.

Realmente está mais para o disse me disse. Ele faz referência ao Saturnino inimigo de Lampião e inimigo é capaz de tudo némesmo? O autor usa e abusa de linguajar abusivo quando fala de Lampião, não como historiador, mas como pessoa física que não aceita a bandidagem de Lampião, e que está no seu direito de não gostar, assim como nós também não apoiamos bandidos e não pela enaltecemos a Lampião como herói e quando escrevemos sobre ele, o fazemos simplesmente para desvendar feitos, estratégias, liderança, carisma, amores por sua mulher e por outras que por sua vida passaram assim como Ciça e Mailurde que cuidaram dos ferimentos de Lampião e lhe oferereceram seu amor, que foi bem recebido por seu bem-amado.
Gostamos de falar dele, para a história, por sermos sim, admiradores não de sua perversidade e sim pelas estórias da história da vida desse bandido idolatrado e temido no sertão nordestino. Por exemplo, quando lemos sobre o caso de seu ferimento que citei acima, que está no livro ‘Lampião, Seu Tempo e Reinado’ na página 126 do segundo da trilogia. Em meu artigo O Poder da Fé ali também posto que "durante todo esse tempo, Lampião era guardado por cangaceiros que, de espaço em espaço e em pontos estratégicos, montavam incessante e rigorosa sentinela, demonstrando assim seu apreço e estima ao grande Chefe. Nessa ocasião, recebeu Lampião, em caráter sigiloso, muitas visitas de "gente fina": do coronel Zé Pereira e seus correligionários, de autoridades, de doutores, de coronéis, de fazendeiros e até dos reverendos padres Floro Dinis, vigário e prefeito de Princesa, Eliseu Dinis e José Leal (vulgo Padre Bezeca), respectivamente esses dois últimos vigário e prefeito de Triunfo. Todos por solidariedade, cortesia ou curiosidade.
Como posso chama-lo de 'mariquinha' ou 'boiola' como se diz hoje, um homem que se desmanchou em amores físicos por essas duas mulheres, pois ainda não conhecia Maria Bonita? Durante sua convalescença, essas duas "esbeltas e despachadas caboclas, rivais em carnagem e beleza, Ciça e Mailurde, cuidavam de Lampião. A primeira, alta e alva, longos cabelos castanhos claros, lhe costurava as camisas, serzia a roupa, que também lavava e passava a ferro, entregando-a sempre perfumada com água de cheiro. A segunda, baixa, olhos esbugalhados e bunduda, amorena-da, lhe preparava papas, quitutes, o de comer. Ambas, cada qual por sua vez, lhe penteavam o cabelo, botando brilhantina para brilhar e cheirar.:. cortavam-lhe as unhas... num desvê-lo minucioso em tudo. Mormente, emprestavam-lhe todo o carinho e ternura feminina, sem restrição. Certa vez, houve entre as duas uma cena de coirana, apaziguada pela interferência de seu bem-amado. Os cangaceiros gostavam de ver que, nessas xumbregações, sutilezas e doçuras femininas do amor, a recuperação de seu Chefe se apressava". - escreveu o Padre Maciel.

A meu ver, o autor desse livro erra quando agride Lampião verbalmente e o chama de 'perobo'; 'boiola'; 'viadinho' e outros adjetivos. Ele cita o livro 'Lampião, senhor do sertão: vidas e mortes de um cangaceiro' de Élise Grunspan-Jasmin na página 60 e não encontrei afirmativa nenhuma do Saturnino a não ser levantar que ele tinha 'coisas de Lampião que não podia dizer'. Isso dito por um inimigo de Lampião que a história conforme diz Rodrigo de Carvalho, citado por Élise, dizendo que Saturnino era  cruel, ciumento e obstinado. Quer dizer; poderia ter dito essas palavras para levantar falso a seu inimigo.
Ponho abaixo dados da referência da página  60 indicada no livro 'Lampião, o mata sete' onde se refere ao grande livro dessa francesa que escreveu 'Lampião, senhor do sertão' e raciocinemos sobre o único indicativo desse livro eivado de barbaridades não históricas. Pois costurar, e usar uma máquina de costura, temos o indicativo de alfaiate se for a tarefa feita por mãos de homem, no caso de Lampião por costurar, não poderia ser um indicativo de ter sido gay, afinal todos os cangaceiros costuravam suas roupas, quando em descanso de suas batalhas.
Para que o leitor possa também verificar ações, posições e atitudes de Virgulino Ferreira, abaixo tomo a liberdade de indicar a leitura do capítulo 25 do livro do Padre Maciel, uma das obras mais completas que li sobre o cangaço.
Definitivamente NÃO! LAMPIÃO não era o que esse livro do 'mata sete' diz.
 
Lampião, Seu Tempo e Seu Reinado – A guerra de guerrilhas
Frederico Bezerra Maciel.
SERROTE PRETO (22 fevereiro de 1925)
Arranchação
Fez parada Lampião na fazenda Serrote . Preto, distante de Mata Grande quatro léguas e continuação do caminho do nascente no rumo de Mariana (Manari).
Bateu na porta da casa de taipa de Constantino Fagundes, vaqueiro do cel. José Malta de Sá. Estava ausente. Com a família, havia ido fazer farinha na serra do Parafuso. Mas, as três moças da casa deram, "sem dificuldade" e até prazenteiras, arranchação a Lampião. Que logo mandou matassem quatro perus para o almoço. Enquanto os panelões de barro fumegavam cozinhando os perus, o arroz e o feijão, e as grandes marmitas de flandes, em forma de cones de vértice truncado, ferviam água para a farofa e .o café, deitou-se Lampião numa boa rede de varanda, armada nos tornos de um quarto de dormir, a modo de tomar uma madorna.
No quarto contínuo, deitado numa cama, Sabiá, gemebundo. Os outros, na sala da frente, jogando "ouro" em cima duma esteira ou descansando na sombra do oitão da casa ou dos pés de pau. Mais adiante, de dentro do curral e trepado num pé alto e dominante de baraúna, a sentinela, que se revezava de hora em hora.
O bafo da onça
De madrugada ainda escuro, alvoroço nas forças aquartela-las em Espírito Santo. Chegara esbaforido, montado num animal, que não se sabe como agüentou o rojão da corrida, um positivo enviado pelo coronel Juca Ribeiro pedindo socorro urgente contra Lampião, inclusive informando que o Rei dos Cangaceiros só tinha vinte homens. No claro do dia, movimentaram-se as volantes na direção de Mata Grande.
Ao meio-dia, chegaram na casa de Firmino Vintém, no pé da serra do Parafuso. Desarriaram, para descanso e para os apreparos do de-comer. Nisso ia passando um rapazelho montado numa besta de escancho, rudado-vermelho, troteira, apenas forrado o lombo com um saco de estopa e governada por um cabresto de corda de caroá. — "Pere aí, esse menino!" — gritou todo -"ímpio" Chico Oliveira. E querendo ser delicado: — "Adonde vai qui má progunto?" — "Vou pru roçado ali mais aguiente" — respondeu. — "Dá notícia de Lampião pru essas banda?" O menino, sobrinho de Constantino, instruído por Lampião, desembuchou tudo. Chico Oliveira ouviu e sorriu de satisfação. Calculou: setenta e cinco praças bem armadas e municiadas contra vinte cangaceiros comandados por um "chefe de nada", como ele dizia. Não havia de que ter sobrosso. Soltou da bainha o punhal que Zé Pereira lhe dera. Alisou-lhe a lâmina com os dois gumes afiados e com a unha experimentou o tinido da ponta aguçada. Prelibando, na sua fantasia imaginativa, o que iria acontecer a Lampião: o punhal lhe penetrando no vão ou furando a veia jugular, a carótida... o sangue esguichando... o cabra aos estertores até ficar inânime... e para completar, ele, Chico, não teria nojo, mas satisfação de lamber o punhal... Estancou, extático, o riso sardônico, o olhar distante... Terminou o devaneio vibrando nos ares, várias,a arma, no gesto de quem apunhalava no invisível a imagem visível de sua alucinação... Guardou o ferro e gritou para a tropa: — "Me acompanhe que hoje só tomo café quando armuçá Lampião!..."
Deixaram a matutagem ali mesmo junto às trempes porque a volta seria ligeiro para o de-comer, festejando a vitória.
Puseram-se em marcha batida. Chico na frente, depois Adauto, enfim João Gomes.
Tomada de posições
A sentinela do alto da baraúna dera o alarme. Num continente movimentou Lampião a defesa. Primeiro retirou, catorze homens para dar retaguarda sob o comando de seus irmãos Antônio e Livino. Uma das moças acompanhou esses homens a fim de mostrar as águas. Recomendou aos irmãos se dividissem em dois grupos no curral e no serrote, e só dessem o ataque de retaguarda depois de meia hora de tiroteio, tempo que calculou para as forças, entusiasmadas com o pequeno número de defensores de dentro de casa, mais se aproximassem e se ajuntassem. Finalmente, atirassem de ponto, não desperdiçando cartucho, pois as forças vinham poderosamente municiadas. De dentro de casa, cuja frente dava para o sul, preparou a barricada, escorando a porta da frente com um pesado pilão de baraúna, e a de detrás com as trempes da cozinha e um grande banco de aroeira. Tirou o baleado da cama e o deitou no chão forrado por uma esteira. O trabalho desse era municiar os fuzis e entregar a um cabra que, por sua vez, passava aos defensores. As duas moças ficaram deitadas no chão do outro quarto.
As volantes, cada qual com vinte e cinco soldados, puxados pelo rapazote 'montado, assim que chegaram ao Serrote Preto, não vendo nenhum movimento de gente, facilmente cercaram a casa, entrincheirando-se pelos pés de pau, pensando iriam pegar Lampião de surpresa. A de Chico Oliveira postou-se pela traseira. E pela frente as de Adauto e João • Gomes. Este, mais atilado, dividiu os seus em três grupos, fazendo-os tomar posições diferentes.
O "almoço" do tenente Imediatamente abriram fogo para cima da casa. Somente depois das primeiras descargas simultâneas dos setenta e oito soldados, começaram, numa simulação de surpresa, os seis defensores a resposta de dentro de casa, assim mesmo com tiros esparsos. Dentro de meia hora os atacantes foram se aprochegando, apertando o cerco. E quando, de inesperado, surgiram, simultaneamente contratacando, as duas retaguardas, Livino com sete homens pela frente e Antônio com outros tantos por trás. Cantando "Mulher Rendeira", berrando e insultando, arremeteram com extrema violência, enquanto os defensores de dentro da casa intensificavam a tiroteiação. Diante de tudo isso a soldadesca caiu em pânico, mas som poder fugir cercados que estavam. Chico Oliveira, meio bêbado, endoidou. De punhal sacado, avançou para a porta de detrás gritando: — "Lampião, filho da peste, vou te sangrar!..." Ao ouvir os gritos de Chico, correu Lampião da porta da frente, onde estava, para a porta de detrás. Retirou os entrIncheiramentos colocados, abriu a porta, saiu, e, à queima roupa, com dois tiros, abateu Chico Oliveira. O primeiro balaço o atingiu na boca fazendo saltar a mandíbula inferior que ficou dependurada na pele da bochecha, o sangue gorgolejando abundante, um esgar horrível. O segundo balaço lhe atingiu, a caixa dos peitos, o coração. Chico foi se arreiando, dobrando os joelhos, o braço direito esticado para o lado, duro, teso, sustentando 'o punhal... E caiu pesadamente de costas junto às rodas de um carro de boi.
O cabo-ordenança que o acompanhava levou uma bala, tamu bém, na caixa dos peitos. Piruteou três vezes sobre si mesmo, a modo de pião, os braços abertos em cruz, urrando rouquenho: ui, ui, ui... indo cair emborcado e escabujando a mil metro de distância da porta. Lampião, ao entrar, tropeçou no batente da porta e quase caiu, recebendo nessa ocasião um tiro disparado pelos inimigos, que lhe açoitou o peito esquerdo, de raspão, gretando lhe a carne num rasgão de meio centímetro de profundidade por uma polegada de comprimento. Num átimo, fechou a porta e chamou uma das moças que lhe trouxe algodão chamuscado para deter o sangue. Continuou o tiroteio cada vez mais acelerado e feroz, sustetado pelo capitão João Gomes. Mas, as retaguardas avançando, os cabras sempre cantando, descompondo, gritando e azurrando quiném feras...
Debandada total
Aproveitando o cafus das seis da tarde, a soldadesca frechou numa carreira desabalada e louca, esbandaiados, rasgando caminho pelos matos, pulando os bancos de macambira, rasgando-se nas unhas de gato, ferindo-se nas juremas e rasga-beiço, deixando, na corrida até Mata Grande, tudo que era de armamento, munição, bornais, cometas, quepes... Livino saiu em perseguição deles, procurando lhes interceptar a fuga, seus cabras zurrando feito jumento. E o que valeu não serem eles todos barrados e dizimados foi a forte chuvada, embora de curta duração.
Após a vitória
De candeeiro aceso, ordenou Lampião se arrastassem os mortos de ao redor da casa para um valado, cavado pela erosão das águas, mais distante, perto do riacho. Contavam-se catorze cadáveres de soldados, afora os do tenente e do cabo. Com exceção do tenente, todos foram sepultados. Quanto ao tenente Chico Oliveira, seu inimigo fidagal, Lampião, de primeiro, o despojou das roupas e apetrechos que distribuiu com os seus. As apragatas lhe deram nos pés, a modo que feitas de encomenda para ele. Ainda encontrou um conto e oitocentos mil réis nos bolsos. Depois, mandou suspendê-lo por uma corda amarrada aos pés num galho de caraibeira. Mantendo-o assim dependurado Pelas pernas abertas e de cabeça para baixo, descarregou-lhe um tiro na testa, cujo tampão da caixa craniana avoou longe espalhando os miolos. Em seguida, a fortes golpes de facão lhe talhou o peito e as entranhas, deixando o corpo pendurado, horrífico, balouçando... "pra servir de exemplo"! Poucos de seus cabras estavam feridos, assim mesmo ao de leve. Além de armas, munições e outros apetrechos deixados no campo pelos vencidos, algumas cuias se encheram de cascas, ou cápsulas de bala, dando assim conta e avaliação do furor da luta.
Passou Lampião a noite na mesma casa. Todos cantando o hino de guerra "Mulher Rendeira". Na euforia da espetacular vitória nem sentiam o cansaço. Dançando, sambando, comendo os perus assados e outros apreparos do de-comer, bebendo pra esfriar o corpo...
Até Sabiá, o cabra ferido, de alegria aparentava sensível melhoria. Chegou mesmo a tomar um trago. Bem cedo descansaram um suficiente para prosseguir em novas viagens e novas aventuras.
Sobrosso em Mata Grande
Quando o povo de Mata Grande viu esturrarem, pelas ruas, magotes de soldados, fugidos do desastre do Serrote Preto, tomou-se de pavor, pânico e terror. Eram soldados sem armas, os dórmas rasgados e breados de sangue e lama, arados de fome e babatando de fraqueza, os ânimos desmerecidos e arriados... Sem falar das outras volantes, contavam-se apenas dezoito praças da do capitão João Gomes. O restante, desaparecido. Mais de vinte feridos, inclusive o tenente Adauto que, por causa da gangrena, teve sua perna amputada pelo médico dr. Bastos. Mesmo assim não resistiu, aumentando o número de mortos. Uma danação! Por felicidade, chegara uma força de sessenta praças assegurando tranqüilidade ao povo que temia a volta de Lampião.
Lealdade de amigo
Pagou Lampião os perus e o trabalho das meninas, obrigando ao fazendeiro a receber determinada importância a título de indenização pelo que sofrera sua propriedade. Reuniu o grupo, ainda não de todo refeito do cansaço da refrega e da festa, e intimou seis homens daquela região a carregar a rede do baleado que, desde Mata Grande, trazia de estrada fora.
Com uma légua de viagem, entrou na catinga. A dois quilômetros acampou ao pé da serra dos Caibros. Deixando o grupo no acampamento, saiu sozinho procurando o rancho de um velho cangaceiro seu amigo, chamado Domingos Antônio. E com ele combinou: que ele, Lampião, de volta ao acampamento, mandaria chamá-lo... que ao chegar o tratasse dando parte de não o ter visto dantes... que, enfim, lhe negasse rancho... Assim foi feito. Mandou Lampião, do acampamento, um dos paisanos, carregador da rede, chamar Domingos, que, se bem combinou, melhor se desempenhou.
Após os cumprimentos, pediu-lhe Lampião, na frente de todos, principalmente dos seis homens, licença para ficar ali uns dois ou três dias descansando e preparando uma matutagern antes de ir s'imbora. De língua passada, foi peremptório Domingos correndo Lampião de sua propriedade: que não podia ficar uma só hora com ele, Lampião, ali... que o mundo estava cheio de forças, só de Alagoas vinham quinhentos soldados, afora as forças pernambucanas e paraibanas... que, no caso de permitir e as forças soubessem, iriam ser mortos ele e toda a sua família de dez filhos, os quais estava ele ainda criando... Fingindo-se conformado, respostou Lampião que não exigia sacrifício de ninguém e iria subir para o alto sertão de Pernambuco.
Tática genial de finta
Despediu-se de Domingos e viajou, à tarde, depois do almoço, "pisando na macambira", isto é, por dentro- da catinga evitando as estradas. As seis horas da tarde, avistou pés de caraibeiras, árvores características do rio Moxotó. Agradecendo, deu vinte mil réis a cada um dos seis carregadores da rede e recomendou contassem a verdade do que viram, sob pena de morrerem. Prometendo assim fazerem, e despedindo-se, retornaram os seis homens a suas terras. Vadeou Lampião o largo leito seco e arenoso do Moxotó em direção da ribeira do Navio, deixando as pegadas bem firmadas e visíveis, de, fácil pista para os rastejadores mais vulgares. Quatro léguas adiante, enviou um positivo a vários de seus grupamentos táticos, distante distribuídos, para entrarem, de ataque por toda parte, em ação de despistamento durante dez dias. Em seguida, dividiu a tropa em grupos: dois de cinco, inclusive num deles o ferido; dois de quatro; ficando ele, com seus dois irmãos Antônio e Livino, formando o menor grupo. E, usando a velha tática sua de esconder os rastos coei apragatas de lã de ovelha para não deixar pista, mandou se espalhassem pela catinga, indo todos se juntarem no rancho de Domingos Antônio, donde haviam saído há dois dias. Um percurso total, ida e volta, de doze léguas. Todos chegados, ali no pé da serra, construíram com rapidez, no que eram peritos, bibocas ou barracas de varas e palha.
Postadas as sentinelas, trataram de se refazerem das lutas, descansando, consertando roupas e objetos de couro, azeitando as armas...
Assim passou Lampião dez dias com seu grupo, enquanto grandes volantes, no piseiro dos rastos encontrados, subiam o sertão à sua procura!... De vez em vez, se ouvia que Lampião estava ali e acolá, em lugares divergentes, desorientando e endoidando a polícia. Eram seus cabras atuando simultaneamente em diversos pontos para despistar, desviar a atenção.
Tiro de misericórdia
Mandou Lampião que Domingos Antônio fosse à farmácia do Gerson Maranhão, em Mariana, comprar iodo e outros romédios para Sabiá que, dia a dia, definhava. Não queria de forma alguma Lampião perdê-lo. Por isso, vinha transportando-o já com dezesseis léguas. E todos os outros testemunhavam com quanto desvelo Lampião cuidava dele com mezinhas e comida especial. O cabra só vivia pedindo:
— "Acabe com isso, Capitão. Pra eu num tem jeito não. Quando acaba, os macacos vão me matá. Prifiro que me mate logo". Chegou mesmo a pedir por amor de Deus, da Senhora da Conceição e do Padim Cirço.
Lampião sempre dizia:
—. "Tá doido, Sabiá. Você vai ficá bom". Mas, nada. Ali estava ele cada vez pior. Não comia mais nada. Com muita dificuldade tomava uns golpinhos de leite. E sempre pedindo:
— "Me mate! Me mate!"
Não queria Domingos Antônio ficar com ele. Se a polícia descobrisse, ele, Domingos, e a família iriam sofrer. Perguntou mais uma vez Lampião a Sabiá se queria morrer. Diante da afirmativa insistente, mandou que ele encomendasse a alma a Deus. Quando ele disse: — "Pronto" e fechou os olhos manejou Lampião o fuzil, aproximou-o da testa e espatifou-lho o crânio com uma bala.
A modo de não deixar sinal de cova, cavou esta no sentido vertical e enterrou o morto em pé, plantando, em cima, um banco de macambira.
Com sinceros agradecimentos, despediu-se Lampião de seu velho e leal amigo Domingos, tendo antes matado uma novilha gorda, de cuja carne, secada e retalhada, proveu todos os bornais do grupo para as novas aventuras.
Prisão do vaqueiro
Em dias da Semana Santa, passou Lucena com uma volante pela casa de Domingos e prendeu-o porque suspeito de coiteiro. Não foi morto por que, chamados por Lucena, sob indicação de Domingos, os seis homens, condutores da rede, cujos testemunhos coincidiram com as respostas do interrogatório ao prisioneiro. Era Sexta-Feira Santa. A velhinha mãe de Domingos se valera de Gerson Maranhão. O qual mandara um bilhete a seu primo Lucena pedindo soltar o preso, que, aliás, já havia sido liberto.
Diário de Guerra
— Março: Gino. Demitido o tenente Gino do Comando Geral das forças em Vila Bela, com ordem de se apresentar ao tenente Pedro Cavalcanti Malta, em Triunfo.
Assumiu provisoriamente o comando geral o sargento Alípio Pereira de Sousa.
O Governador do Estado, Sérgio Loreto, proibiu Gino de penetrar no município de Vila Bela. Dada a Gino uma volante de apenas doze praças. Temendo Lampião, que já se achava à sua procura, mandou Gino pedir ajuda a Zé Pereira. Este escolheu dez de seus mais perigosos cangaceiros e os enviou ao suplicante. Por ironia da sorte, Gino, que perseguia cangaceiros, agora se valia deles e com eles andou ' mais de mês pelas catingas do Navio! ...
— 11 de março: Capturados, em Rio Branco, pelo tenente João Luís, três cangaceiros do grupo de Lampião: Antônio Clementino, velacho "Fato de Cobra", Joaquim Pedro e José Raimundo Cândido.
30 de março: Grupo de cangaceiros sob o comando de Zé Pequeno assaltou novamente o município de Mata Grande.
13 de abril: Fazenda Água Branca, no município de Vila Bela. Os cangaceiros Zé Paulo e Sabino Gomes atacaram a residência do rendeiro João Alves Pereira. Renhido tiroteio. Saldo: mortos  João Alves e Zé Paulo; feridos três filhos e nora do rendeiro; Sabino com ferimentos graves.
15 a 20 de abril: Proximidade de Alagoa de Baixo (hoje Sertãnia). Num tiroteio, Gino desbaratou pequeno grupo de cangaceiros.
30 de maio: Enviou Lampião, cartel a Pão de Açúcar (Alagoas).
-- 15 de junho: No município de Buíque, encontro da polícia com um grupo de Lampião comandado por Antônio Barbosa, velacho Parafuso, que morreu.
NOTA: Lampião deu cabo dos quatro irmãos Oliveiras — Francisco, Manuel, Cícero e José — tenentes da polícia paraibana.